Fermentação natural

Eu não sou padeira. Não sou nem cozinheira, na verdade. Cozinho por necessidade e diletantismo, e aprendi a fazer pães sozinha. Faço do meu jeito, e certamente há inúmeros detalhes que não domino e não faço da maneira “mais correta”. No entanto, venho fazendo pães há alguns anos, e neste período progredi bastante. Meus pães são saborosos, aprendi a produzi-los investindo o mínimo de esforço possível, e eles trazem muita alegria para mim e para todos os que me rodeiam. O que de mais natural, então, do que querer dividir essa alegria?

Além de ser mais tradicional (a fermentação é processo muito antigo que se desenvolveu de modo independente e simultâneo em várias regiões do mundo), o pão de fermentação natural tem vantagens indiscutíveis sobre os pães produzidos com fermento biológico. Ele é de muito mais fácil digestão, pois grande parte do amido e do glúten já foram parcialmente digeridos (ele pode inclusive ser bem tolerado por algumas pessoas que têm intolerância ao glúten, ainda que não por celíacos); ele permite uma melhor assimilação dos minerais, pois não tem fitatos; ele é mais saboroso e perfumado; e ele tem melhor resistência e maior durabilidade. Suas desvantagens estão essencialmente associadas a aspectos técnicos: o tempo de fermentação mais longo, o trabalho demandado para cuidar do levain e o fato de que a massa é mais sensível à qualidade da farinha, da água, e às variações de temperatura.

Para mim, aprender a fazer pão foi uma tarefa que precisou de muito estudo, pois eu não consegui avançar enquanto não comecei a entender todos os processos que estavam por trás do crescimento da massa. E é justamente esse pouco que já aprendi que trago aqui para vocês. Mas não espere muito mais do que questões elementares e orientações básicas sobre a fermentação natural. Para quem quiser aprender mais (e há muito a aprender!) e se aprofundar no assunto, há farta literatura disponível. Como ponto de partida, sugiro os livros “Flour Water Salt Yeast” (Ken Forkish, 2012), “Tartine Bread” (Chad Robertson, 2013), “Larousse dos pães” (Eric Kayser, 2015), “Le Grand Manuel du Boulanger” (Rodolphe Landemaine, 2016), “Apprendre à faire son pain au levain naturel” (Henri Granier, 2017) e o brasileiro “Pão nosso” (Luiz Américo Camargo, 2018). E existem muitos outros, além de inúmeros blogs, páginas e grupos de discussão dedicados ao assunto em redes sociais e em outras plataformas na internet.

Na nossa sociedade moderna, em que tudo tem que ser muito rápido, muita gente pensa que fazer pão é perder tempo, mas eu prefiro pensar em investir tempo. Considero que a qualidade do produto que estou produzindo é muito superior ao que eu poderia encontrar no comércio a um custo abordável, e que fazer meu próprio pão é um prazer que vale o esforço. Além disso, da forma como eu vejo, a fermentação natural não demanda tanto esforço assim. É preciso planejar com antecedência e ficar várias horas ou até dias em função da massa – entre os tempos de espera e de efetiva dedicação – mas o tempo de manipulação é praticamente o mesmo ou até menor do que fazer pão caseiro com fermento biológico, seja fresco ou seco. Sem contar que os tempos de dedicação à massa podem ser momentos de criação, de paz, de diversão, e o esforço físico, quando ocorre, é prazeroso. E tempo, como tudo na vida, é uma questão de prioridade. Para mim, o que nós ganhamos em sabor e saúde é muito recompensante, e vale a pena o investimento.


Pão de centeio

Pão de café

Pão de campanha

Pão (quase) branco

Criando seu próprio fermento